sábado, 16 de outubro de 2010

Questão social contemporânea- Segurança Pública

15/10/2010

Por Marilzete de Almeida*

Ainda hoje muitos conceitos psicanalíticos são de extrema relevância, sendo inimaginável a compreensão do indivíduo no contexto social e individual pela extensa complexidade do desenvolvimento deste, onde se tem características internas e fatores externos que influenciam em suas atitudes. No entanto Freud em seus estudos e trabalhos nos remete há análises do indivíduo a partir do patológico o que nos aproxima do entendimento de tais comportamentos do indivíduo “o porquê de tal ação”. Para uma breve análise e equiparação a algumas teorias de Freud como teórico da modernidade bloqueada será abordada a questão da segurança pública frisando as ações dos policiais.

Segundo a revista Veja a invasão de um hotel de luxo por 60 bandidos fortemente armados com fuzis e pistolas no Rio de Janeiro traz à tona a discussão sobre segurança pública e como chegou a esse ponto.

Policia despreparada: Cerca de 300 policiais foram expulsos dos batalhões em 2009 por terem praticado atos criminosos como corrupção, extorsão, roubo e assassinato.

A realidade mostra que a maioria dos que trajam um uniforme oficial e portam uma arma de fogo não sabem lidar com o poder e a responsabilidade que isso traz, e acabam tirando proveito da situação para obter vantagens pessoais.

Os que recebem algum tipo de punição é minoria absoluta, visto que os mecanismos de punição desses agentes ainda precisam ser aperfeiçoados. Por exemplo, os julgamentos destes acabam ficando perdidos no emaranhado de instâncias administrativas, e alguns permanecem na ativa livremente nas ruas, ou seja, a sensação de impunidade deve estar fixa em suas mentes.

Tais criminosos fardados acabam comprometendo também algumas ações policiais, como as operações especiais, na qual os agentes acabam facilitando a vida de marginais em troca de propina, avisam sobre operações e dão cobertura ao crime organizado, fazendo escoltas e também vista grossa.

No Brasil ainda é muito pouco o que tem sido feito, alguns rodízios nas corporações evitam a corrupção, pois são desconhecidos uns dos outros.

Para policiamento ostensivo, são recrutados PMs que acabaram de ingressar na corporação, pois eles tem um padrão diferente dos mais experientes na questão de conduta e contam com menos força bruta, mais inteligência e sobretudo estão longe dos péssimos hábitos.

Mediante a questão social supracitada visa-se fazer uma reflexão social a partir da psicanálise freudiana a causa de tais comportamentos de sujeitos, suas atitudes tais como dos policiais. Freud aborda várias questões à partir do patológico como forma de entender o que é considerado socialmente normal para alguns, sendo que para este a neurose é normal porque é resultado de conflitos internos e bloqueios pré existentes. Safatle (2010) descreve que é necessário fazer uma reflexão social levando-se em conta o que o individuo crê e deseja da vida, a maneira pela qual mobilizam sistema de crenças, desejos e interesses, ou seja, quando o ser humano justifica para si mesmo a necessidade de adotar certos tipos de comportamento.

Equiparando as atitudes dos policiais a análise freudiana observa-se que cada um age conforme aquilo que pensa ser o correto ou oportuno. Em resposta a estes comportamentos concretizados estão interligados e mediatizados pelas construções ético-religiosas, sendo que neste desencantamento o sujeito reconhece sua pequenez a submete-se a contingência (certo ou incerto), cada um assume sua insignificância no curso do mundo no paralelo da vida profissional.

Nos campos da política, da organização familiar, dos processos de constituição da subjetividade e da reprodução da vida material, o ser humano se organiza a partir de noções de autoridade, de culpabilidade, de providência, de soberania e de necessidade claramente geradas no interior de práticas e atitudes do cotidiano. Nesse seguimento ocorre o que Freud conceitua de modernidade bloqueada, na qual o indivíduo na maioria das suas ações contradiz o seu íntimo o que realmente deseja. No seu desenvolvimento humano é “injetado conceitos de normas e a submissão há uma instancia superior de uma figura de liderança”.

Nesse seguimento nota-se que os policiais agem mediados por aquilo que acreditam ser viável e se direcionam na conquista de algo sem medir consequências. Uma grande parte segue caminhos errôneos onde matam, traficam e são corruptos e extremamente violentos. Parte da população sente fragilizada por não poder atribuir a confiança que desejam as autoridades policiais de nossa época. Vale indagar: o que levaria os policiais da era contemporânea a tais comportamentos? Existem justificativas para esses comportamentos inescrupulosos?Ou exclusivamente explicada por fatores socioculturais, ou, ao contrário, é determinada por fatores peculiares às subjetividades dos indivíduos implicados?

Em consonância com a Psicanálise de Freud à partir dos descritos de Vladimir (2010) poderia ser visto como Visão Animista a qual corresponde ao Narcisismo Primário onde projetamos nossos sistemas de crenças, interesses e desejos do mundo, o que impede a distinção entre percepção e alucinação; Freud coloca como uma das marcas maiores desta a crença a onipotência do pensamento, a forma natural de vê o mundo. O qual percebe a inconseqüência dos policiais que se confundem aos bandidos e partem para mesmas atitudes, como “eu quero o mundo” à forma que desejo vê-lo e o que acho certo naquele momento sem medir as conseqüências, muitas vezes usando argumentos na tentativa de justificarem suas ações.

Esta forma de ação está submetida a si mesmo e também sob o regime do prazer em fazer tal coisa, percebe que os policiais têm prazer em torturar quando prendem ou quando abordam alguém que infringe a lei ou quando simplesmente acham que este alguém apresenta características assim. Na verdade tal atitude é transposição do pensamento ao mundo exterior. Então para Freud a partir deste patológico assumido por eles (policiais) verifica-se que o comportamento apresentado por estes é conseqüência de bloqueios adquiridos ao longo da vida, pois ainda estão presos ao passado, vivências anteriores, ou seja, experiências.

“O conceito freudiano denominado identificação comporta a abordagem dessa complexidade de que decorre a aprovação à prática policial, porque supera a rígida separação entre o sociocultural e a subjetividade. Referido à operação psicológica inconsciente que constitui a subjetividade individual e propicia os vínculos sociais, ou relações intersubjetivas, o processo identificatório resulta da articulação entre três níveis de fatores: de ordem sociocultural, de ordem psicológica universal e de ordem psicológica individual “(Maria Aparecida Morgado)

Na psicologia das massas abordadas por Freud para se formar o eu são identificadas tipos e figuras ideais que explicam como desejar, agir e julgar, assim o eu terá várias identificações deixando suas marcas no interior de um processo histórico de maturação subjetiva. Internalizando a lei social, através da constituição de uma instância moral de observações (o supereu) assumida pelos policiais, esta visão desenvolve-se a partir do momento em que o desamparo transforma-se em afeto subjetivo central. Safatle(2010) .

No entanto pode-se considerar que para compreender a gênese social da figura moderna do eu seria a condição necessária para elucidação do que está em jogo na determinação do comportamento sociopolítico no interior da sociedade civil em grupos (horda).

De acordo com o texto Totem e tabu o qual se refere ao proibido, alguns parâmetros não são atribuídos por esta parcela de policiais o que seria “a lógica da instituição ou para sociedade”. Dentro das leis impostas pela instituição e equiparadas as leis básicas do totemismo comuns podem se destacar duas características não matar o animal totêmico e evitar relações sexuais. Sendo estes os mais antigos e poderosos desejos humanos. O que nos leva a pensar que é de extrema necessidade que hajam leis que coíbam e limitem os seres humanos na sociedade civil para que tenha uma sociedade civilizada.

O tabu se caracteriza por ser uma força com base própria onde desenvolve nas normas e costumes que são regidas pelos indivíduos, podendo se transformar em leis. A própria convicção moral conduz o indivíduo, pois há uma “certeza interna que qualquer violação conduzirá a desgraça” (Freud).

Entretanto Freud diz que o homem evoluiu em alguns aspectos, mas o seu lado “horda primitiva” permanece dentro dele e pode emergir a qualquer momento onde tenha um grupo de pessoas como se pode verificar nas ações dos policiais, principalmente em situações de extremo estresse onde flui este lado impulsivo. Em termos de massa, a regressão social acontece nos casos de guerras, revoluções. Freud utiliza-se de duas instituições sociais, a igreja e o exército, para explicar sobre como a massa age. Em ambas as instituições, os indivíduos internalizam um supereu identificando-se com a figura de líder, ocorrendo uma fundação fantasmática onde as pessoas obedecerão às regras não devido a elas em si, “mas por fantasias que determinam a significação e os modos de aplicação de injunções que tem força de lei”.

No contexto contemporâneo nota-se uma grande parcela da população altamente bloqueada ou fragilizada com relação ao que é dito normal pela sociedade civil, há uma inexistência quando nos reportamos à figura de um soberano em algumas situações apresentadas. O ser humano se encontra perdido entre o eu (subjetivo) e ao externo ao lidar com o meio social. Entretanto muitos infligem à lei por não terem se desenvolvido dentro do que Freud relata com relação a compreensão da vida social ,a partir do desenvolvimento progressivo de três grandes visões do mundo, sendo a animista, a religiosa e a científica. Sendo este o processo de maturação subjetiva do sujeito rumo ao narcisismo primário, posteriormente à internalização da lei moral e da constituição do supereu e finalmente ao ensaio das expectativas emancipatórias.





Bibliografia

VEJA Editora; edição 2182-ano 43-nº 37,15 de setembro de 2010.

SAFATLE, Vladimir; Freud como teórico da modernidade bloqueada, Vitória: UFES, 2010

www.ufmt.br/gpejd/publicacoes/artigos/violenciainstitucionaldireitoshumanos.htm

Nenhum comentário:

Postar um comentário