sábado, 16 de outubro de 2010

Questão social contemporânea- Segurança Pública

15/10/2010

Por Marilzete de Almeida*

Ainda hoje muitos conceitos psicanalíticos são de extrema relevância, sendo inimaginável a compreensão do indivíduo no contexto social e individual pela extensa complexidade do desenvolvimento deste, onde se tem características internas e fatores externos que influenciam em suas atitudes. No entanto Freud em seus estudos e trabalhos nos remete há análises do indivíduo a partir do patológico o que nos aproxima do entendimento de tais comportamentos do indivíduo “o porquê de tal ação”. Para uma breve análise e equiparação a algumas teorias de Freud como teórico da modernidade bloqueada será abordada a questão da segurança pública frisando as ações dos policiais.

Segundo a revista Veja a invasão de um hotel de luxo por 60 bandidos fortemente armados com fuzis e pistolas no Rio de Janeiro traz à tona a discussão sobre segurança pública e como chegou a esse ponto.

Policia despreparada: Cerca de 300 policiais foram expulsos dos batalhões em 2009 por terem praticado atos criminosos como corrupção, extorsão, roubo e assassinato.

A realidade mostra que a maioria dos que trajam um uniforme oficial e portam uma arma de fogo não sabem lidar com o poder e a responsabilidade que isso traz, e acabam tirando proveito da situação para obter vantagens pessoais.

Os que recebem algum tipo de punição é minoria absoluta, visto que os mecanismos de punição desses agentes ainda precisam ser aperfeiçoados. Por exemplo, os julgamentos destes acabam ficando perdidos no emaranhado de instâncias administrativas, e alguns permanecem na ativa livremente nas ruas, ou seja, a sensação de impunidade deve estar fixa em suas mentes.

Tais criminosos fardados acabam comprometendo também algumas ações policiais, como as operações especiais, na qual os agentes acabam facilitando a vida de marginais em troca de propina, avisam sobre operações e dão cobertura ao crime organizado, fazendo escoltas e também vista grossa.

No Brasil ainda é muito pouco o que tem sido feito, alguns rodízios nas corporações evitam a corrupção, pois são desconhecidos uns dos outros.

Para policiamento ostensivo, são recrutados PMs que acabaram de ingressar na corporação, pois eles tem um padrão diferente dos mais experientes na questão de conduta e contam com menos força bruta, mais inteligência e sobretudo estão longe dos péssimos hábitos.

Mediante a questão social supracitada visa-se fazer uma reflexão social a partir da psicanálise freudiana a causa de tais comportamentos de sujeitos, suas atitudes tais como dos policiais. Freud aborda várias questões à partir do patológico como forma de entender o que é considerado socialmente normal para alguns, sendo que para este a neurose é normal porque é resultado de conflitos internos e bloqueios pré existentes. Safatle (2010) descreve que é necessário fazer uma reflexão social levando-se em conta o que o individuo crê e deseja da vida, a maneira pela qual mobilizam sistema de crenças, desejos e interesses, ou seja, quando o ser humano justifica para si mesmo a necessidade de adotar certos tipos de comportamento.

Equiparando as atitudes dos policiais a análise freudiana observa-se que cada um age conforme aquilo que pensa ser o correto ou oportuno. Em resposta a estes comportamentos concretizados estão interligados e mediatizados pelas construções ético-religiosas, sendo que neste desencantamento o sujeito reconhece sua pequenez a submete-se a contingência (certo ou incerto), cada um assume sua insignificância no curso do mundo no paralelo da vida profissional.

Nos campos da política, da organização familiar, dos processos de constituição da subjetividade e da reprodução da vida material, o ser humano se organiza a partir de noções de autoridade, de culpabilidade, de providência, de soberania e de necessidade claramente geradas no interior de práticas e atitudes do cotidiano. Nesse seguimento ocorre o que Freud conceitua de modernidade bloqueada, na qual o indivíduo na maioria das suas ações contradiz o seu íntimo o que realmente deseja. No seu desenvolvimento humano é “injetado conceitos de normas e a submissão há uma instancia superior de uma figura de liderança”.

Nesse seguimento nota-se que os policiais agem mediados por aquilo que acreditam ser viável e se direcionam na conquista de algo sem medir consequências. Uma grande parte segue caminhos errôneos onde matam, traficam e são corruptos e extremamente violentos. Parte da população sente fragilizada por não poder atribuir a confiança que desejam as autoridades policiais de nossa época. Vale indagar: o que levaria os policiais da era contemporânea a tais comportamentos? Existem justificativas para esses comportamentos inescrupulosos?Ou exclusivamente explicada por fatores socioculturais, ou, ao contrário, é determinada por fatores peculiares às subjetividades dos indivíduos implicados?

Em consonância com a Psicanálise de Freud à partir dos descritos de Vladimir (2010) poderia ser visto como Visão Animista a qual corresponde ao Narcisismo Primário onde projetamos nossos sistemas de crenças, interesses e desejos do mundo, o que impede a distinção entre percepção e alucinação; Freud coloca como uma das marcas maiores desta a crença a onipotência do pensamento, a forma natural de vê o mundo. O qual percebe a inconseqüência dos policiais que se confundem aos bandidos e partem para mesmas atitudes, como “eu quero o mundo” à forma que desejo vê-lo e o que acho certo naquele momento sem medir as conseqüências, muitas vezes usando argumentos na tentativa de justificarem suas ações.

Esta forma de ação está submetida a si mesmo e também sob o regime do prazer em fazer tal coisa, percebe que os policiais têm prazer em torturar quando prendem ou quando abordam alguém que infringe a lei ou quando simplesmente acham que este alguém apresenta características assim. Na verdade tal atitude é transposição do pensamento ao mundo exterior. Então para Freud a partir deste patológico assumido por eles (policiais) verifica-se que o comportamento apresentado por estes é conseqüência de bloqueios adquiridos ao longo da vida, pois ainda estão presos ao passado, vivências anteriores, ou seja, experiências.

“O conceito freudiano denominado identificação comporta a abordagem dessa complexidade de que decorre a aprovação à prática policial, porque supera a rígida separação entre o sociocultural e a subjetividade. Referido à operação psicológica inconsciente que constitui a subjetividade individual e propicia os vínculos sociais, ou relações intersubjetivas, o processo identificatório resulta da articulação entre três níveis de fatores: de ordem sociocultural, de ordem psicológica universal e de ordem psicológica individual “(Maria Aparecida Morgado)

Na psicologia das massas abordadas por Freud para se formar o eu são identificadas tipos e figuras ideais que explicam como desejar, agir e julgar, assim o eu terá várias identificações deixando suas marcas no interior de um processo histórico de maturação subjetiva. Internalizando a lei social, através da constituição de uma instância moral de observações (o supereu) assumida pelos policiais, esta visão desenvolve-se a partir do momento em que o desamparo transforma-se em afeto subjetivo central. Safatle(2010) .

No entanto pode-se considerar que para compreender a gênese social da figura moderna do eu seria a condição necessária para elucidação do que está em jogo na determinação do comportamento sociopolítico no interior da sociedade civil em grupos (horda).

De acordo com o texto Totem e tabu o qual se refere ao proibido, alguns parâmetros não são atribuídos por esta parcela de policiais o que seria “a lógica da instituição ou para sociedade”. Dentro das leis impostas pela instituição e equiparadas as leis básicas do totemismo comuns podem se destacar duas características não matar o animal totêmico e evitar relações sexuais. Sendo estes os mais antigos e poderosos desejos humanos. O que nos leva a pensar que é de extrema necessidade que hajam leis que coíbam e limitem os seres humanos na sociedade civil para que tenha uma sociedade civilizada.

O tabu se caracteriza por ser uma força com base própria onde desenvolve nas normas e costumes que são regidas pelos indivíduos, podendo se transformar em leis. A própria convicção moral conduz o indivíduo, pois há uma “certeza interna que qualquer violação conduzirá a desgraça” (Freud).

Entretanto Freud diz que o homem evoluiu em alguns aspectos, mas o seu lado “horda primitiva” permanece dentro dele e pode emergir a qualquer momento onde tenha um grupo de pessoas como se pode verificar nas ações dos policiais, principalmente em situações de extremo estresse onde flui este lado impulsivo. Em termos de massa, a regressão social acontece nos casos de guerras, revoluções. Freud utiliza-se de duas instituições sociais, a igreja e o exército, para explicar sobre como a massa age. Em ambas as instituições, os indivíduos internalizam um supereu identificando-se com a figura de líder, ocorrendo uma fundação fantasmática onde as pessoas obedecerão às regras não devido a elas em si, “mas por fantasias que determinam a significação e os modos de aplicação de injunções que tem força de lei”.

No contexto contemporâneo nota-se uma grande parcela da população altamente bloqueada ou fragilizada com relação ao que é dito normal pela sociedade civil, há uma inexistência quando nos reportamos à figura de um soberano em algumas situações apresentadas. O ser humano se encontra perdido entre o eu (subjetivo) e ao externo ao lidar com o meio social. Entretanto muitos infligem à lei por não terem se desenvolvido dentro do que Freud relata com relação a compreensão da vida social ,a partir do desenvolvimento progressivo de três grandes visões do mundo, sendo a animista, a religiosa e a científica. Sendo este o processo de maturação subjetiva do sujeito rumo ao narcisismo primário, posteriormente à internalização da lei moral e da constituição do supereu e finalmente ao ensaio das expectativas emancipatórias.





Bibliografia

VEJA Editora; edição 2182-ano 43-nº 37,15 de setembro de 2010.

SAFATLE, Vladimir; Freud como teórico da modernidade bloqueada, Vitória: UFES, 2010

www.ufmt.br/gpejd/publicacoes/artigos/violenciainstitucionaldireitoshumanos.htm

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Violência Policial: uma ameaça à democracia

José Jorge Antunes de Sá

Aluno Especializando em Filosofia e Psicanálise pela UFES


A violência policial é um fato – basta lembrar Carandiru, Candelária, Eldorado dos Carajás – não um caso isolado ou um “excesso” do exercício da profissão como querem fazer crer as corporações policiais e as autoridades ligadas ao sistema de justiça e segurança. E, em se tratando de um fato concreto, deve ser encarada como um grave problema a ser solucionado pela sociedade. Um grave problema porque a violência ilegítima praticada por agentes do Estado, que detêm o monopólio do uso da força, ameaça substancialmente as estruturas democráticas necessárias ao Estado de Direito.

Sabendo-se que a Força adquirida pelo Estado, segundo pensamentos de Freud, foi construída ao longo da história da evolução social humana, sendo utilizada como instrumento regulador das ações humanas no meio político-social, dando embasamento para a aceitação de uma conduta social realizada. A figura da polícia na sociedade é caracterizada como um mito; esta detêm o poder de julgamento e punição, regulação e controle social, julgamento do certo e errado dentro de uma sociedade organizada em fundamentos de leis e ordens, cabendo a esta instituição o julgamento das condutas da sociedade e fazendo cair sobre esta os valores do peso da Lei (FREUD, 1913 - 1950).

A criança, durante seu desenvolvimento social, projeta a figura do policial como aquele detentor de poder e de julgamento dos indivíduos, sendo agentes transformadores da sociedade organizada, e muitas vezes esta criança almeja seguir a carreira policial quando adulta, almejando o referido poder de julgar as pessoas.

A polícia representa o aparelho repressivo do Estado que tem sua atuação pautada no uso da violência legítima. É essa a característica principal que distingue o policial do marginal. Mas essa violência legítima está ancorada no modelo de “ordem sob a lei”, ou seja, a polícia tem a função de manter a ordem, prevenindo e reprimindo crimes, mas tem que atuar sob a lei, dentro dos padrões de respeito aos direitos fundamentais do cidadão – como direito à vida e à integridade física.

A ausência de respeito ao modelo de “ordem sob a lei” tem se perpetuado dentro da estrutura policial brasileira por razões diversas – como a falência dos modelos policiais, o descrédito nas instituições do sistema de justiça e segurança, a impunidade – mas principalmente por uma certa tolerância da própria sociedade com esse tipo de prática. Analisando o problema do ponto de vista sócio-político veremos que a violência policial tem raízes culturais muito antigas (desde a implantação do regime colonial e da ordem escravocrata), e que estas têm uma relação diretamente proporcional à ineficiência do Estado de punir, na maioria dos casos, as práticas criminosas dos agentes de segurança.

É difícil admitir, mas existe uma demanda dentro da sociedade para a prática da violência policial. É esta violência que serve à sociedade dentro de diversos aspectos e circunstâncias, mas especialmente no tocante à solução dos crimes contra o patrimônio e na repressão às classes perigosas. Por isso mesmo, a dificuldade do Estado no âmbito da segurança pública, no final do século XX, continua sendo o controle da violência legítima, do qual decorreria conseqüentemente a extinção do uso ilegítimo da força por parte dos organismos policiais.

Segundo um artigo da Datafolha (1997), existe uma divergência na aplicação da Lei imposta a todos sob igual peso. O aparelho repressivo estatal criminaliza certas classes sociais dentro da sociedade, como o preto ou mulato, jovem, pobre, taxando-os como “cara de prontuário”. Os negros são abordados com mais freqüência, recebem mais insultos e mais agressões físicas que os brancos em São Paulo. Percentualmente, também há mais revistados negros que qualquer outro grupo étnico.Entre os da raça negra, quase metade (48%) já foi revistada alguma ver. Desses, 21% já foram ofendidos verbalmente e 14%, agredidos fisicamente por policiais. A população branca é menos visada pela polícia. Entre estes, 34% já passaram por uma revista, 17% ouviram ofensas e 6% já foram agredidos, menos da metade da incidência entre negros.

O preconceito historicamente construído faz parte da organização, já que antes de iniciar a carreira profissional, o indivíduo que almeja seguir na carreira já possui suas crenças e percepções, satisfações e preconceitos, trazendo estas condutas para a Instituição, em seu exercício profissional.

O comportamento individual é absolutamente distinto do comportamento dos indivíduos no interior das massas, considerando essa massa como uma reviviscência da horda originária, conforme explana Freud, nem sempre ocorre no exercício do poder aplicado pela força policial, onde o comportamento preconceituoso e ilegítimo poder soberano que estes indivíduos internalizam é aplicado no dia-a-dia de seu trabalho, muitas vezes excedendo o limite de poder socialmente formulado pela sociedade para o exercício da instituição (SAFATLE, 2010).

A questão da democracia é, então, um ponto de extrema importância nesse debate. Isso porque a violência policial inevitavelmente gera as mais graves violações aos direitos humanos e à cidadania, que são elementos inerentes ao regime democrático. Alguns estudos, sobre a mesma temática da violência policial e do autoritarismo, desenvolvidos pelo cientista político Paulo Sérgio Pinheiro (2004), demonstram que as práticas policiais de natureza autoritária são práticas que têm acontecido independente do regime político. Isso se deve, segundo a análise de Pinheiro, a uma continuidade de práticas utilizadas no regime autoritário que a transição política não conseguiu extinguir, pelo fato dos governos de transição terem tratado os aparelhos policiais como organismos neutros nos quais a democracia política atacaria suas raízes autoritárias. Esta continuidade, entretanto, possibilitou a adequação de práticas autoritárias dentro de um governo democrático, gerando com isso a existência de um “regime de exceção paralelo” (PINHEIRO, 2004, p. 38).

Para tentar se encontrar um caminho que ajuste os órgãos de segurança à realidade democrática é importante, antes de tudo, que a sociedade descubra que tipo de polícia ela quer: uma polícia que respeite os direitos do cidadão, que exista para dar segurança e não para praticar a violência; ou uma polícia corrupta (que livra de flagrantes os filhos das classes abastadas); arbitrária (que utiliza a tortura e o extermínio como métodos preferenciais de trabalho e que atingem na sua maioria as classes populares) e preconceituosa. Dentro disto, é preciso pensar nas formas de restringir as oportunidades da polícia utilizar a violência ilegítima, seja através do rígido controle de armamentos ou do limite do reconhecimento da legitimidade do uso da força a situações particulares. Finalmente, o que não se deve perder de vista dentro desta discussão é o risco que a tolerância à violência policial acarreta para a democracia. Sem uma polícia condizente com práticas democráticas e de respeito aos direitos fundamentais do cidadão vai existir sempre a ameaça de que o “regime de exceção paralelo” transforme-se num regime institucional.

Segundo Hobbes, citado por Diehl (2009, p. 35), o motivo que leva os homens a viver em estados “é a precaução com a sua própria conservação e com uma vida mais satisfeita. O desejo de sair daquela mísera condição de guerra, que é conseqüência necessária das paixões dos homens, quando não há um poder visível capaz de mantê-los em respeito e os forçar, por meio do castigo, ao cumprimento dos seus pactos e à observância das leis da natureza”. O estado de segurança é gerado, portanto, em oposição ao estado de natureza. É para obter sua segurança, tão instável e insuficiente, que os homens unem-se e formam o Estado, e criam a corporação policial dentro deste Estado para que as Leis sejam seguidas e respeitadas por todos

A Lei simbólica, para a Psicanálise, é expressa no inconsciente por meio de suas formações – sonho, sintoma, chistes – e equivale ao que Freud nomeou como a lei de interdição do incesto, ou mito do pai Primevo. Essa lei é representada pelo pai que não é necessariamente o genitor, mas o pai simbólico como instância legal, um puro significante. A violência surge quando os indivíduos querem para si o poder sobre a Lei, para impô-la sobre os demais. Porém, essa procura constante da imposição da Lei feita pelos organismos policiais fazem que o uso da força passe muitas vezes de legítima para uma força opressora e repreensiva ilegítima, para interesses pessoais e corporativos, e esta violência tem se tornado cada vez mais comum e já faz parte de nossa cultura.

Aceitar que a violência possa ser banalizada e naturalizada é uma tentativa de diluir o seu impacto, seu terror; de se evadir de seus efeitos, de não se implicar com a existência de suas manifestações e com as possibilidades, por pequenas que sejam de sua transformação. Esta banalização da violência é, talvez, um dos aliados mais fortes de sua perpetuação. Resignado à idéia, inculcada pela repetição do jargão de que somos ‘instintivamente violentos’, o homem curva-se ao destino e acaba por admitir a existência da violência, como admite a certeza da morte.

Segundo Souza (2000) Freud nos diz que inicialmente o mundo se apresenta para a criança sem diferenciação, mas logo ganha matizes diferentes dependendo das qualidades de prazer implicadas nas experiências. Insere os objetos que são prazerosos e afasta aquilo que se constitui como motivo de desprazer, mesmo aquilo que provém de si próprio. O mundo exterior fica assim dividido em uma parte prazerosa que se incorpora e um resto que é estranho e hostil. O sentido primitivo do ódio é o da relação contra o mundo exterior, alheio ao ego. "Sentimos repulsa ao objeto desprazeroso e o odiamos. Este ódio pode intensificar-se até a tendência à agressão contra o objeto e o propósito de aniquilá-lo" (Souza, 2000).

Segundo Freud (1930, p. 132), em seus estudos aplicados à clínica:

"O Ego odeia, perturba e persegue com propósitos destrutivos a todos os objetos que chega a supor como fonte de sensações de desprazer, constituindo uma privação da satisfação sexual ou da satisfação de necessidades de conservação. Pode-se, inclusive, afirmar que o verdadeiro protótipo da relação de ódio não procede da vida sexual, mas da luta do ego por sua conservação e manutenção."

Sem desconsiderar o valor do que a psicanálise pode nos trazer em termos de compreensão ou tentativa de compreensão do que na constituição do sujeito se revela como causador de medo e gerador de violência, entendendo a corporação policial como entidade socialmente fundada para a manutenção da paz e da aplicação universal da Lei regida, não há porque tomar a violência, uma vez mais, como sendo da ordem natural das ações de promoção e aplicação das Leis socialmente criadas. Afinal o que Freud pretendia era que revelando o inferno das almas, o estudo do inconsciente, o homem pudesse ter mais acesso à sua dominação e transformação, de como suas condutas pessoais são explicáveis nos meios sociais, e a debater um bem estar comum e a manutenção do limite de poder que as entidades policiais detêm para seu próprio exercício e controle.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIEHL, Frederico. O que HOBBES diria sobre o nosso Estado de Segurança. Revista Filosofia Ciência e Vida, Editora Escala, São Paulo, n. 36, p. 28 - 36, 2009.

FREUD, Sigmund. (1930). O mal-estar na civilização. Obras completas, v.21. Rio de Janeiro: Imago; 1997.

FREUD, Sigmund. Totem e Tabu e outros trabalhos. Trans. James Strachey. Londres e Nova York: W.W. Norton & Company, ([1913] 1950).

PINHEIRO, Paulo Sérgio. Política Social e Democracia. 1. Ed. São Paulo: Cortes, 2004.

SAFATLE, Vladimir. Freud como teórico da modernidade bloqueada. Vitória: Universidade Federal do Espírito Santo, Núcleo de Educação Aberta e a Distância, 2010. 52 p.

SOUZA, Maria L. R. A banalização da violência: efeitos sobre o psiquismo. Disponível em http://www2.uol.com.br/percurso/main/pcs25/abanalizacaodaviolencia.htm. Acesso em 02 Outubro 2010.

VERGARA, Rodrigo. Negros são mais abordados e agredidos. Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, 06 abril 1997. Especial.

Questão Social Contemporânea - Um caso na Psicanálise “O caso Bruno”

15/10/2010


Por Sueli Avellar do Nascimento*


 
Safatle (2010) apresenta conceitos fundamentais da psicanálise freudiana, objetivando apresentar a partir de tais conceitos, uma plataforma de reflexão referente a questões do sujeito sobre a modernidade: capitalismo, liberalismo econômico e individualismo. Tais questões perpassam pelos universos da sociologia e da política. Ainda se remete ao longo do mesmo, às idéias de Freud sobre sexualidade humana e sobre desenvolvimento individual serão apresentadas juntamente com as de doença mental e sexualidade.
O caso escolhido para aplicação dos conceitos freudianos trabalhados no livro de Safatle (2010) foi extremamente divulgado pela mídia nacional. Aproximadamente há quatro meses, os brasileiros presenciaram uma grande quantidade de informações sobre o desaparecimento de uma modelo, após seu envolvimento com um conhecido jogador de futebol, o goleiro Bruno, do Clube de Regatas Flamengo. A partir daí, os fatos foram intitulados “O Caso Bruno”.
No início de 2009, Bruno, casado, conhece Eliza no Rio de Janeiro. Os dois começam um relacionamento extraconjugal. Logo após Eliza engravida. A mesma registra queixa contra Bruno, na DEAM - Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher de Jacarepaguá, no Rio de janeiro, por tentativa de sequestro, agressão e ameaça. Bruno nega ter cometido qualquer desses delitos. Após o episódio, a polícia pediu medidas protetoras que impediam o goleiro de se aproximar mais de 300 metros de Eliza e de sua família. Bruno passou a ser investigado criminalmente.
Com o nascimento do filho de Eliza. Bruno não reconhece a paternidade. Segundo o advogado Jader Marques, advogado do pai de Eliza, ela move um processo na Justiça para Bruno reconhecer a paternidade do filho e pagamento da pensão. O último contato feito pela família segundo o advogado Jader Marques. Amigas de Eliza contam que ela iria até Minas Gerais para conversar com Bruno, a pedido dele. A partir daí, ela não entra em contato com ninguém. Posteriormente Eliza é supostamente assassinada por Marcos Aparecido dos Santos, o "Bola”. Pelo 181 (Disque-denúncia), a polícia recebe denúncias que Eliza teria sido agredida, morta, suas roupas teriam sidas queimadas e o corpo ocultado em um sítio do atleta Bruno em Esmeraldas, Minas Gerais. Desde então o sítio é vigiado.
Policiais militares e bombeiros tentaram entrar no sítio, mas não conseguem, por não terem um mandado judicial. De posse do mesmo a policia faz buscas no sítio do goleiro em busca do corpo de Eliza. Foram encontradas roupas de mulher, objetos de criança além de fraldas. Segundo a polícia vestígios de sangue de Eliza foram encontrados no veículo. A polícia recebe uma denuncia, dizendo que o corpo da vitima foi jogado em uma lagoa em Ribeirão das Neves, Minas Gerais.
Um menor de 17 anos, que foi apreendido no apartamento do Bruno, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, depõe na Delegacia de Homicídios da Barra da Tijuca. Ele afirma que participou do seqüestro da ex-amante do jogador, e deu coronhadas na vitima. Nas quatro páginas de inquérito em que relatam um crime atroz, Eliza teve os braços amarrados com uma corda e foi estrangulada por Marcos Aparecido dos Santos, conhecido como bola, um ex-policial. Ainda segundo o menor ouvido pela polícia, após ter estrangulado Eliza, Bola pediu para que todos deixassem o local. Depois, seguiu em direção a um canil, carregando um saco que supostamente continha o cadáver esquartejado de Eliza. Ainda segundo o adolescente, a mão de Eliza foi jogada para cachorros da raça Rottweiler.
A prisão preventiva de Bruno e de mais sete pessoas foram expedidas pela Justiça de Minas. O mandado de internação do jovem que prestou depoimento no dia 06 de julho. A Justiça de Rio de Janeiro também havia expedido a prisão preventiva para Bruno e Luiz Henrique Romão, conhecido como Macarrão pelo sequestro e cárcere privado de Eliza Silva Samúdio, em outubro de 2009. Bruno e Macarrão se entregam à polícia no Rio de Janeiro. Mãe de Eliza consegue a guarda provisória na Justiça do neto de quatro meses. A criança estava na casa do avô materno em Foz do Iguaçu. Bruno e os outros suspeitos no desaparecimento de Eliza Samúdio são mantidos presos na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, Região Metropolitana de Belo Horizonte. Os presos estão em celas isoladas, de 6m² e sem comunicação entre elas. O inquérito é entregue. Bruno, Macarrão, Bola e mais seis pessoas são indiciadas.
A partir do patológico Safatle (2010) antes de introduzir as idéias de Freud como objeto de reflexão da modernidade, inicia explicando que o pai da psicanálise parte do patológico como via de acesso ou entendimento daquilo que é considerado socialmente normal. Partir do patológico para legitimar a normalidade, é descobrir o reverso do adoecer. Nesse processo, Freud identifica que a neurose é normal porque é fruto ou resultado do conflito entre os desejos individuais do sujeito e os ideais da cultura (Safatle, 2010).
Tal conflito produz sofrimento. Logo, é normal todos terem algum grau ou nível de dor psíquica. Mas é na neurose obsessiva que esse processo ganha cores doentias produzindo sintomas, inibição e angústia. Assim, a diferença entre o normal e o patológico, é qualitativa, já que de muitas formas o percurso da normalidade é muito próximo ao da doença.
Freud descobre que de alguma forma, as pessoas estão presas ao seu passado. Assim as respostas tanto para a neurose obsessiva quanto para as dificuldades sexuais estão na infância. A doença mental, para ele, pertence a uma teoria da regressão (Safatle, 2010), já que o processo de maturação ficou preso, bloqueado ou impedido nos primeiros anos da existência.
Em sentido oposto à maturação, a doença mental percorre o caminho inverso do desenvolvimento, levando o individuo à condutas mais restritas e limitadas. Freud utiliza-se do conceito de filogenia para conceber o homem como fruto de um desenvolvimento progressivo rumo à maturidade, uma espécie de evolucionismo.
O criador da psicanálise concebe a vida social a partir do desenvolvimento de três grandes visões de mundo: a animista, a religiosa e a científica. Todas as três caminham para uma maturação subjetiva do sujeito rumo ao narcisismo primário, posteriormente à internalização da Lei moral e da constituição do supereu e finalmente ao ensaio das expectativas emancipatórias.
Podemos conceituar sinteticamente animismo como uma visão de mundo e de explicação da origem das coisas a partir do pensamento de que tudo é animado por uma infinidade de seres espirituais.
Para Freud, essa forma mágica de ver a vida e o mundo, o animismo, é possível através da onipotência do pensamento, submetido à busca de explicar as coisas através de si mesmo e também sob o regime da procura do prazer.
O filósofo Auguste Comte fala que inicialmente o homem conhece a si mesmo e explica as coisas a partir de si. Depois ele transporta essa condição para explicação do mundo exterior, chegando a uma maturidade filosófica.
Para Freud, tal transposição do pensamento do homem, que a partir de si mesmo explica todas as coisas, é chamada de narcisismo. Ou seja, a experiência é nomeada e vivenciada a partir de si mesmo.
Na segunda visão de mundo de Freud, surgirá a religião e ele descreverá a instância psíquica da consciência moral (o supereu) como resultado de um desamparo que a criança sofre ao sentir que o ela e o mundo não são a mesma coisa. Para ele, tal desamparo levará à busca de algo que supra esse vazio.
No modelo animista, o homem fazia parte da natureza. Freud fala de uma separação do homem e da natureza através da possibilidade da morte, da diferença sexual e da contigência absoluta do objeto do desejo. Todas três contribuem para um desencantamento do mundo.
Na busca de ser aceito e amado socialmente, haverá a internalização das normas sociais a partir do pai, representante da Lei. Para agir “socialmente” é preciso abrir mão das próprias pulsões: “Toda cultura deve ser necessariamente edificada sobre a repressão e a renúncia pulsional” (Freud).
Para Freud, Deus nada mais é do que um pai elevado. O deus de cada um é formado a partir das experiências com o pai. E ele diz ainda que as massas necessitam de uma autoridade que se possa admirar. Ou seja, o desamparo é central para a constituição do sujeito social e das instituições sociais.
Após o desencantamento do mundo, Freud entende que o homem está pronto para fazer ciência, no sentido de reconhecer a própria pequenez e não se abrigar mais no discurso religioso. Apesar disso, ele reconhece que a modernidade está bloqueada porque a formação do imaginário pessoal da família burguesa está fundamentada na culpabilidade, nas figuras de autoridades, na providência, na soberania e em situações geradas essencialmente dentro de uma visão religiosa de mundo.
O mito está a serviço de apresentar soluções de conflitos sociais (Safatle, 2010). Freud, objetiva dar uma estrutura para as sociedades modernas organizadas, a partir da internalização dos sujeitos de figuras de autoridades ou instituições “poderosas”.
Tal internalização do sujeito só foi possível devido ao que Freud escreveu referente ao mito do pai primevo, já que “vivíamos anteriormente em pequenas hordas”. E nesse mito, os filhos se reúnem e assassinam o pai. Após fazerem-no, um sentimento de tristeza os abate porque o pai primevo não era apenas a figura de coerção, mas também objeto de amor e identificação.
Assim, “em relações sociais atuais, os sujeitos agem como quem carrega o peso do assassinato de um pai que nada mais é do que a encarnação imaginária de representações fantasmáticas de autoridade e soberania”. A figura do pai é perpetuada através de representações sociais sublimadas.
Freud diz que o homem evoluiu em alguns aspectos, mas o seu lado “horda primitiva” continua vivo dentro dele e pode surgir a qualquer momento onde tenha um grupo de pessoas. Em termos de massa, a regressão social acontece no casos de guerras, revoluções, etc.
Ele vai utilizar de duas instituições sociais, a igreja e o exército, para explicar sobre como a massa age. Em ambas as instituições, os indivíduos internalizam um supereu identificando-se com a figura de líder, ocorrendo uma fundação fantasmática onde as pessoas obedecerão às regras não devido a elas em si, “mas por fantasias que determinam a significação e os modos de aplicação de injunções que tem força de lei”.
Safatle (2010), fala sobre a questão do totalitarismo, traçando um paralelo entre o ditador e o pai primevo, mostrando pontos comuns, tendo a lei e a ordem como foco. O facista consegue ser uma exceção quanto à regra, de alguma forma não sendo regido completamente por ela, mas por outro lado, ele promove-a.
Para explicar “O Caso Bruno” a partir de lentes freudianas (de acordo com o livro de Safatle, 2010), vemos que ocorreu uma regressão a uma etapa onde a criança exige a satisfação de suas pulsões egoístas agressivas. Onde se tem o retorno a uma fase do desenvolvimento onde não há o controle da agressividade. Ocorre uma visão infantil e patológica do outro (Eliza Samudio) como simples objeto que pode ser manuseado e manipulado de acordo com os desejos de seu possuidor. Observa-se também a tentativa simbólica de assassinar a “ordem e a autoridade”, uma espécie de volta ao mito do pai primevo que representava a coerção, a ordem e o poder. Está claro uma relação direta entre dinheiro / fama com poder e satisfação sexual. Frisa-se também “Mini” regressão social, agindo como horda primitiva.
É perfeitamente possível fazer uma crítica social do presente a partir dos textos de Freud. A psicanálise apresenta então, uma forma antecipada de reações sociais de massa antes mesmo delas acontecerem. A partir de uma leitura psicanalítica do indivíduo, em alguns aspectos, é possível aplicar esse conhecimento para as massas. Logo, é preciso concordar que a modernidade está bloqueada em termos “comportamentais” de acordo com aquilo que o criador da psicanálise propôs.

Bibliografia

SAFATLE, Vladimir; Freud como teórico da modernidade bloqueada, Vitória: UFES, 2010.

Em http://pt.wikipedia.org/wiki/Caso_Eliza_Samudio . Acesso em: 12 outubro 2010.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

O MESTRE EMANCIPADOR

RESUMO



O mestre emancipador projeta em seus discípulos o principio de autonomia e busca pela sabedoria, a fim de que o mesmo tenha vontade de aprender e liberte com esse conhecimento adquirido nesta trajetória.

Enquanto o mestre instrutor se coloca na postura do detentor do saber e que seus discípulos são dependentes dele como se fosse a única fonte de conhecimento possível, criando assim uma prisão e uma condição de subalternos e não libertação.

A postura do mediador em EAD têm que ser uma postura de emancipador, pois na era em que vivemos não cabe a um único “ser” ser o detentor do saber, uma vez que a cada minuto os conhecimentos se multiplicam numa rede universal de mídias.


Lacan e a Mestria do Inconsciente no Processo de Ensino Aprendizagem

RESUMO


Lacan acredita na origem inconsciente do sujeito; utiliza o imaginário e o simbólico. Nesse sentido o psicanalista em referência introduz a reflexão e análise o que seria papel do “tutor” no processo de aprendizagem e a metodologia EAD. O tutor, entretanto conceitua-se como mediador e oferece suportes com intuito de direcionar, questionar e o principal orientar, mas a “resultante” dentro do processo de aprendizagem EAD tem como ator principal o aprendiz, ou seja, o aluno. Outro ponto que caracteriza a metodologia EAD é o cartel que consiste no trabalho realizado em pequenos grupos que se reúnem em torno de um tema, contrariando o ensino tradicional.

Palavras chaves: Lacan, EAD, sujeito, processo de aprendizagem.